O Ministério da Economia enviou ao Congresso, na última quinta-feira (3), a proposta de emenda à Constituição (PEC) que trata da reforma administrativa. Mais enxuta do que o esperado por especialistas, a proposta mira nos futuros servidores públicos, ou seja, as regras não afetam quem já é funcionário público.
A PEC acaba com diversos benefícios de funcionários públicos considerados como privilégios pelo governo federal, como a licença-prêmio, os aumentos retroativos, as férias de mais de 30 dias, o adicional por tempo de serviço e as reduções de jornada sem diminuição de pagamento. Mas o principal benefício que a maioria das carreiras deixará de ter é a estabilidade.
Para isso, o governo decidiu extinguir o Regime Jurídico Único (RGU), que hoje rege as contratações do setor público. No lugar, foram criadas outras cinco vinculações, das quais somente uma prevê a estabilidade: a de carreiras típicas de Estado, que são aquelas posições essenciais ao funcionamento dos poderes da República.
A grande maioria dos novos servidores que passarem nos próximos concursos públicos deve se enquadrar na categoria de “cargos por prazo indeterminado”, que não vão ter estabilidade. Por outro lado, as novas regras permitem que essas pessoas trabalhem em mais de um lugar ao mesmo tempo, o que hoje é proibido para a maioria dos servidores.
“Esses servidores vão poder conciliar a atividade de servidor público com qualquer outra atividade privada e até com uma atividade pública de um outro ente. Poderia ser servidor federal e servidor municipal se, de repente, um dos vínculos permitirem uma jornada de meio período. Todas essas possibilidades estão abertas para o servidor do cargo por tempo indeterminado mas não estão para o servidor de carreira típica de Estado”, explica o secretário especial adjunto de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Gleisson Rubin.
O problema é que, apesar de constar na Constituição, não existe uma definição clara de quais categorias se encaixam na “carreira típica de Estado”. Por isso, para que as regras da reforma administrativa passem a valer, será necessária a aprovação de um projeto de lei listando quais carreiras entram em qual tipo de vínculo.
“Existe um entendimento muito bem consolidado que o afrouxamento das carreiras típicas de Estado poderia aumentar a influência política no serviço público. A depender da inclinação política de um governo ou de outro, esses profissionais poderiam ser demitidos”, explica Paulo Liporaci, advogado especialista em Direito Administrativo. “Vai caber ao Congresso posteriormente, por meio de projeto de lei de iniciativa do presidente definir quais são essas carreiras típicas de Estado. Certamente vai ter uma nova discussão”, explica.
A MP também cria dois outros vínculos, que não precisam de concurso público: o “vínculo de prazo determinado”, uma espécie de contrato temporário que poderia ser aplicado em uma gama maior de situações do que é previsto atualmente. Já no “cargo de liderança e assessoramento” unifica os cargos comissionados e as funções gratificadas.
Presidente com mais poderes
Outro ponto da proposta da reforma administrativa acaba fortalecendo o presidente, centralizando nele atribuições que atualmente precisam da concordância do Congresso. No começo do mandato, Jair Bolsonaro, teve dificuldade para extinguir e remanejar órgãos públicos, já que a manobra foi feita a partir de uma Medida Provisória, que pode ser derrubada ou alterada pelos parlamentares. Para facilitar esse processo, a PEC vai dar poder para o presidente extinguir órgãos, funções, cargos e gratificações, tudo por meio de decreto, podendo reorganizar inclusive autarquias e fundações. O assunto pode gerar desavença com os parlamentares, que sairão enfraquecidos caso a proposta seja aprovada com esse formato.
“Hoje, temos um desequilíbrio entre Executivo, Legislativo e Judiciário sobre organização interna. Alterações de estrutura, organização, passam por uma situação de muita rigidez”, argumentou Rubin na apresentação da PEC.