Desde o início da vacinação no Brasil, no dia 17 de janeiro, já foram registrados casos de desvios de doses para pessoas que estão “furando fila” dos grupos prioritários; MP orienta como população pode ajudar a denunciar prática, considerada crime
O ano de 2021 começou com esperança para os brasileiros: a chegada da tão esperada vacina contra a Covid-19. Mas após quase um ano convivendo com o vírus, que já matou quase 215 mil pessoas só no Brasil, a boa notícia tem se transformado em um problema a ser enfrentado. Denúncias de desvio de vacinas nas unidades da Federação comprometem a chance de milhões de brasileiros que aguardam a vez na fila e colocam gestores em todo o País em situação de alerta.
Manaus, capital amazonense, foi palco de uma triste realidade nas últimas semanas. O sistema de saúde local entrou em colapso por falta de oxigênio para tratar pacientes acometidos pela Covid-19 e por outras doenças nos hospitais. Já são mais de 6,5 mil mortos em todo o estado, que agora encara a suspensão da vacinação contra o vírus. A medida foi tomada depois de uma investigação do Ministério Público sobre a suspeita de irregularidades na aplicação do imunizante, com pessoas fora dos grupos prioritários “furando a fila”.
O Ministério Público Federal (MPF) requisitou da prefeitura de Manaus, de forma imediata e urgente, informações sobre os profissionais de saúde já vacinados, a escala de trabalho dos profissionais na Unidade Básica de Saúde (UBS) Nilton Lins em janeiro e a lista de atendimentos realizados por eles na unidade de saúde nos dias 18 e 19 deste mês. A principal acusação sobre irregularidades na vacinação em Manaus envolve duas médicas vacinadas no dia 18 – a família das jovens é dona de hospitais e universidades particulares em Manaus, entre outros negócios.
“Os governantes municipais estão organizando as prioridades a partir daquilo que é orientado pelo Ministério da Saúde. As vacinas não são suficientes sequer para esse grupo prioritário e os governantes estão junto com os secretários de Saúde em permanente contato com o governo federal para definir essa prioridade”, garante o secretário-executivo da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), Gilberto Perre.
Para ele, as supostas “furações de filas” devem ser, sim, apurados. “A FNP está orientando seus associados para seguirem com bastante rigor nessa fila, respeitando quem é prioridade. A população pode ajudar fiscalizando e os governantes podem ajudar oferecendo transparência dessas informações, de tal forma que as prioridades sejam obedecidas”, reforça Perre.
Outros estados também são alvos de investigação. Municípios da Bahia, Ceará, Pernambuco e Sergipe também enfrentaram os chamados “fura-filas” no esquema de vacinação, incluindo prefeitos e pessoas em cargos públicos. Lembrando que, nesse primeiro momento, por conta da escassez de doses, só vacinam profissionais da saúde que estiveram na linha de frente contra a doença, idosos em asilos e indígenas que vivem em aldeias.
“Os gestores municipais devem observar e garantir a vacinação dos grupos prioritários (grupos de risco e vulneráveis), sem qualquer alteração, seja porque se trata de vacinação aprovada apenas com uso emergencial, seja diante de um cenário de escassez de vacinas”, explica a advogada especialista em saúde e direito médico Mérces da Silva Nunes.
Ela alerta para as consequências em casos de desvio. “Uma provável abertura de processo por improbidade administrativa, sem prejuízo de outras penalidades (multa e detenção) que poderão ser aplicadas também aos demais envolvidos.”
Crime
O MPF orienta a população a ajudar no combate aos desvios na vacina. Segundo o Ministério, se a pessoa presenciou ou recebeu informações de fontes confiáveis sobre episódios de desvio de vacinas contra a Covid-19 deve denunciar ao MP, visto que a prática é considerada crime.
Pelo celular, é possível baixar o aplicativo MPF Serviços ou registrar a denúncia diretamente na Sala de Atendimento ao Cidadão. Além disso, o cidadão pode acionar o Ministério Público Estadual e o Ministério Público de Contas. Todos esses órgãos estão atuando de forma conjunta para apurar as denúncias de fraudes.
Para denunciar, o MP orienta reunir o máximo de informações possíveis, como fotos, vídeo, mensagens, data da ocorrência, local e nomes de possíveis envolvidos. Esse material pode ser enviado pelos canais virtuais de atendimento.
Qualquer pessoa que não se encaixe nos critérios para vacinação nesse primeiro momento e tenha vacinado deve ser denunciada. Segundo os MPs, a prática pode ser enquadrada como improbidade administrativa – a vacina contra Covid-19 é um bem público, já que foi custeada com verbas públicas, além de ser oferecida gratuitamente à população. Por isso, o MP reforça a importância de se respeitar os critérios definidos pelas autoridades de saúde para priorização.
Entre as penalidades, o responsável pelo ato pode ser punido não só criminalmente, mas pode até perder o cargo ou função pública, caso seja servidor ou agente público, e ser condenado a pagar multa até 100 vezes o valor do salário que recebe.
Fonte: Brasil 61