O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Ayres Britto disse hoje (6), ao participar de um debate sobre o equilíbrio entre os Três Poderes, promovido pela Federação do Comércio de São Paulo, que a crise política pela qual o país passa é um processo de “purgação” e aperfeiçoamento da democracia. “Essa democracia [que], finalmente, não aceita mais escamoteação… [e] que começa a se dar o respeito. Uma democracia que resolveu altivamente sair do armário”, destacou.
“Nesse contexto transicional, a democracia experimenta uma fase de fadiga. Como que por cansaço democrático, a coletividade experimenta uma desagradável sensação de torpor, de desorientação. Uma espécie de desalento, de descrédito”, afirmou. Ele disse que acredita que o processo político atual, com denúncias de corrupção vindo a público constantemente, é um período de transição importante para o amadurecimento político do Brasil.
Liberdade e transparência
Um dos principais elementos que catalisam essa mudança é, segundo Ayres Britto, a liberdade de atuação dos veículos de comunicação. “A plenitude de liberdade da imprensa está desaguando nesse tipo ideal turbinado de cidadania. Tudo vem a lume, transparência. Estamos excomungando a cultura do bastidor. [É] por isso que a crise está sendo tão conhecida, tão estudada, debatida, desnudada”, ressaltou .
Para o ex-ministro, existem ainda resistências dos setores da sociedade que se beneficiavam da corrupção. “A velha ordem, autoritária, corporativa, corrupta, perdulária de recursos públicos… é teimosa, malandra, insidiosa, resistente e não joga a toalha.”
Ayres Britto ressaltou a importância do julgamento da Ação Penal 470, conhecida como o processo do mensalão, do qual participou como ministro do STF, para mudar certas relações na sociedade. “A partir do mensalão, o princípio republicano de que todos são iguais perante a lei chegou para o direito penal. E moradores do andar de cima da sociedade passaram a responder por suas malfeitorias vendo o sol nascer quadrado, inclusive.”
Crise é internacional
Para o professor Joaquim Falcão, diretor da Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas, o processo pelo qual o Brasil passa faz parte de uma conjuntura internacional. Para Falcão, o desencanto com o sistema político ocorre em várias nações, e “a democracia está em risco em todos os países”.
“Todos com um problema comum, que é a corrupção. A corrupção não é invenção brasileira”, citou. “Dois candidatos a presidente da França [Marine Le Pen e François Fillon] são acusados de algum tipo de corrupção. E sabe o que ocorreu? Eles dizem que vão continuar candidatos. A gente está muito perto de tudo”, afirmou.
Falcão disse que é necessário encontrar as raízes das mazelas, em vez de simplesmente focar em um grupo de culpados. “Se a gente não enfrentar a corrupção do mercado e das empresas, não vai adiantar nada. O problema não é a corrupção do político, ou do empresário, ou do candidato. O problema é a relação que se formou entre os três.”
*Agência Brasil