Brasil e Mundo Saúde

Hospitais privados têm pico de hospitalizações de Covid em novembro e dificuldades financeiras

Dados de nota técnica do Observatório da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) evidenciam preocupações tanto em relação ao avanço da pandemia no País quanto em relação às dificuldades econômicas do setor

Médicos fazem treinamento no hospital de campanha para tratamento de covid-19 do Complexo Esportivo do Ibirapuera.

As crises de saúde e economia provocadas pelo novo coronavírus seguem em crescimento evidente. Dados da 5ª edição da Nota Técnica (NT) do Observatório da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), por exemplo, mostram que o número de pacientes que procurou atendimento com suspeita da Covid-19 chegou a ser maior em novembro, mês das eleições municipais no País, do que no pico da pandemia, em junho, e nem mesmo as unidades de saúde particulares escaparam dos problemas econômicos.

As aglomerações observadas durante o período de campanha de candidatos a prefeitos e vereadores em 2020 podem explicar aumentos de contaminações e hospitalizações no fim do ano, como avalia a infectologista Joana D’arc Gonçalves. “Com certeza o período eleitoral contribuiu muito para a situação que a gente vive hoje, até porque naquele período foi um momento em que nós tivemos a ‘interiorização’ do vírus. Cidades pequenas que não tinham tido contato com a Covid passaram a ter, o movimento político foi desorganizado, sem proteção, as pessoas mantiveram um modelo de comício presencial, sem máscaras. Tudo isso contribuiu para o aumento da transmissibilidade.”

Esses movimentos de multidões preocupam, ainda, pela maior possibilidade de mutações virais que podem ser mais letais, segundo a médica. Especialistas em saúde lembram também que a relação direta entre um aumento de casos e um evento específico é complexa, mas que todos os eventos que provocaram aglomerações, como as festas de fim de ano, podem ter contribuído para o maior fluxo de pacientes com infecções nos hospitais. É o que pontua o vice-presidente da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, Alexandre Cunha.

“É muito difícil saber o que causou exatamente o aumento de casos. Com certeza foi a diminuição do distanciamento social e das medidas restritivas da população, mas saber o que cada fator individual levou a isso, como as eleições em novembro, é difícil. Geralmente, a gente observa aumentos relacionados a um fato individual cerca de duas ou três semanas após, mas com certeza qualquer tipo de redução de distanciamento social por parte da população tem relação com o aumento do número de casos”, explica.

Economia

Os hospitais privados terminaram o ano de 2020 com resultados financeiros inferiores aos de 2019, levantando preocupações quanto à capacidade econômica para atendimento da população neste ano. O estudo realizado pela associação conclui que as instituições terminaram 2020 com despesas elevadas e receitas reduzidas por conta dos efeitos já sofridos pela segunda onda de contaminações da Covid-19.

Além da queda de rendimentos financeiros, houve ainda diminuição na taxa de ocupação de leitos em relação a 2019, que passou de 77% para 67,7%, em 2020. Os números são explicados por fatores como o adiamento de cirurgias eletivas e a fuga de pacientes ao cuidado hospitalar para tratar outras doenças, provocadas pelo receio da contaminação, que reduz a quantidade de consultas, exames e outros procedimentos, também prejudicando questões relacionadas à saúde e à economia.

Análises e alternativas

André Cezar Medici, economista de saúde e conselheiro do Instituto Brasileiro de Valor em Saúde (IBRAVS), avaliou, durante webinar promovido pela Associação Nacional de Hospitais Privados, que a situação de complexidade do ano de 2020 deve perdurar neste ano no setor.

“A minha impressão é de que 2021 vai ser um ano muito parecido com o final de 2020. A gente tem que continuar investindo nas medidas de proteção pessoal, evitar que as pessoas fiquem com cansaço [do isolamento], evitar o negacionismo. Todas essas questões são muito importantes para se continuar vivendo em um ambiente em que a situação se mantenha sob controle”, afirmou.

A nota técnica dos hospitais também mostra que a curva de casos de pacientes atendidos no pronto-socorro com suspeita da Covid-19 havia diminuído em julho, mas voltou a subir em setembro, apresentando a maior taxa do ano em novembro. Em dezembro, houve uma pequena queda, de apenas 0,8%.

A taxa de pacientes com suspeita de infecção atendidos no pronto-socorro com diagnóstico positivo confirmado chegou a 41,2% em dezembro, valor bem próximo ao registrado no pico da pandemia, em junho, quando houve 41,5%. Ao mesmo tempo em que o cenário de infecções crescia, 2020 registrava, porém, despesas ultrapassando as receitas dos hospitais da associação.

Bruno Sobral, secretário-executivo da Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), avalia que o momento exige medidas de prevenção individuais e ações governamentais. “Os hospitais e laboratórios vão voltar a sofrer os problemas que sofreram no início [da pandemia]. A receita caiu bastante, os custos se elevam. Nesse momento acho que uma ajuda governamental seja importante, em especial o diferimento de impostos, seria bastante importante para que os prestadores privados de saúde pudessem ter caixa para pagar salários, que é fundamental nesse momento”, pontua.

Cenário atual

Quando observados os contextos da pandemia por todo o País, somando unidades de saúde pública e privadas, a alta taxa de ocupação de leitos exige ações. É o que fica evidenciado na Nota Técnica Extraordinária do Observatório Covid-19 Fiocruz, de 1º de março, que calcula que entre as 27 capitais do País, 20 estavam com taxas de ocupação de leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) Covid-19 para adultos em 80% ou mais. Outras cinco capitais estavam ainda com taxas superiores a 70%.

“Os dados são muito preocupantes, mas cabe sublinhar que são somente a ‘ponta do iceberg’. Por trás deles estão dificuldades de resposta de outros níveis do sistema de saúde à pandemia, mortes de pacientes por falta de acesso a cuidados de alta complexidade requeridos, a redução de atendimentos hospitalares por outras demandas, possível perda de qualidade na assistência e uma carga imensa sobre os profissionais de saúde”, traz a nota.

De acordo com dados do Ministério da Saúde, a Semana Epidemiológica 28, que corresponde ao período entre 5 a 11 de julho de 2020, foi a que mais registrou casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) hospitalizados, com 36.067 quadros no intervalo de tempo.

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