Agência Congresso – Meio de transporte rápido, que favorece o deslocamento e o estacionamento e é mais fácil de ser adquirido, as motocicletas vêm, ao longo do tempo, ocupando as ruas das principais cidades brasileiras e também dos pequenos e médios municípios.
De acordo com relatório produzido pelo Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV), Ambev e Falconi Consultores de Resultados, a frota de motos saltou de 4,6 milhões para 20 milhões – um aumento de 335% – no período de 2001 a 2012 no Brasil.
O mesmo estudo também aponta que 55,1% dos feridos no trânsito do país são motociclistas. A Perkons, empresa que desenvolve e aplica tecnologia para a segurança no trânsito, ouviu um especialista em segurança viária para compreender a urgência na mudança dessa perspectiva.
O cabelereiro Rafael Ferreira Guimarães pilotava há 12 anos e utilizava a motocicleta para ir diariamente para o trabalho.
Já tinha sofrido dois acidentes de menor gravidade, segundo ele, mas, recentemente, teve clavícula fraturada, escoriações pelo corpo todo e na cabeça, apesar do uso do capacete – que saiu com a queda -, jaqueta e botas.
O acidente foi na via Dutra, em São Paulo. “Estava na mão da direita, a 80 km por hora e o carro veio como uma bala. Quando me viu, tentou desviar. Caí no acostamento e, por isso, estou vivo”, conta.
Como o terceiro sinistro trouxe consequências e quase lhe custou a vida, Rafael decretou: era hora de aposentar a motocicleta.
Na opinião de Eduardo Biavati, mestre em sociologia e consultor em educação para segurança no trânsito, o crescimento da frota de motocicleta nos últimos 20 anos não justifica o número de acidentes e mortes de motociclistas no país.
“O mesmo se repete na França, Itália e Japão, mas não vemos nesses países uma realidade tão triste, uma explosão de mortalidade como observamos no Brasil”, afirma.
Para ele, as estatísticas envolvendo os motociclistas por aqui são reflexo de diversos fatores: não há políticas públicas voltadas para os motociclistas, falta sinalização, a fiscalização é ineficiente e a formação dos condutores que dirigem sob duas rodas é precária.
“As vias públicas brasileiras não foram preparadas para receber tantas motocicletas, mas, esses condutores, poucos capacitados e sem equipamentos de segurança adequados, passaram a trafegar por elas. Some a esse cenário a omissão dos órgãos públicos e temos a realidade atual”, enfatiza o consultor.
Um estudo realizado pelo Infosiga SP – banco de dados que reúne informações de acidentes de trânsito de diversas fontes – aponta que, no Estado de São Paulo, as ocorrências envolvendo motocicletas são a principal causa de óbitos por sinistros de trânsito.
Porém, essa realidade não é exclusiva das metrópoles. “Nas regiões Norte e Nordeste, por exemplo, o quadro é agravado pela falta de infraestrutura e pela desinformação quanto ao uso de equipamentos de segurança, o que aumenta o número de óbitos e feridos”, diz Biavati.
Ainda de acordo com o relatório Retrato da Segurança Viária no Brasil, entre 2003 e 2014, a frota de motocicletas no Nordeste aumentou 414%, saltando de 1,2 milhão para 6,2 milhões, representando 44% dos veículos da região.
Além disso, das quatro cidades com maiores índices de óbitos no trânsito por 100 mil habitantes no Brasil, três estão no Nordeste: Presidente Dutra (MA), Sobral (CE) e Barbalha (CE).
O que diz a legislação
Quando o assunto são as motocicletas, a legislação de trânsito brasileira deixa lacunas na interpretação. Um exemplo é o famoso “corredor”, faixa entre os veículos por onde motociclistas costumam circular.
Em 1997, o artigo 56 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) restringia motos nesses espaços, porém, foi vetado.
“A rigor, hoje o Código não proíbe e nem autoriza o tráfego no corredor. O problema dessa prática é que o motociclista ocupa um lugar onde já não há mais tempo de manobra e a maior gravidade se dá pela diferença de velocidade em relação aos outros veículos, que trafegam com mais lentidão”, diz o consultor.
Mas, para não incorrer em infração, os motociclistas devem ficar atentos também ao artigo 192, que determina que todos condutores devem guardar distância de segurança lateral e frontal entre o seu veículo e dos demais.
A legislação não prevê qual é essa distância, portanto, a interpretação desse artigo é subjetiva. Outra falha na legislação, na visão de Eduardo Biavati, é a circulação de motociclistas nas rodovias.
“Na Europa, para pilotar motos em rodovias, é necessário comprovar certo tempo de experiência em carteira e a autorização só é liberada para condutores com motos maiores, mais seguras e com motores mais potentes. No Brasil, quem é habilitado e possui um modelo dos mais simples, pode atravessar o país”, acrescenta.
Para Biavati, uma alternativa para diminuir sinistros envolvendo motociclistas são ações casadas de intensificação da fiscalização e campanhas educativas.
“As duas precisam ser simultâneas, como vemos no exterior. Desde que dilatou o número de motociclistas, há 20 anos, não houve nenhuma política pública em âmbito nacional para modificar a triste realidade que se desenhou. São os acidentes envolvendo motociclistas que nos mantém no patamar mais alto da mortalidade no trânsito”, finaliza.
Por Giovana Chiquim/Perkons