Opinião e Artigos Política

Opinião: A pedalada de Herzem e as pedras jogadas pra cima

Por Ernesto Marques

A sabedoria popular recomenda cuidado ao jogar pedras para o alto pelo risco de alguma delas cair sobre a cabeça de quem as atira. Durante oito anos, desde a sua primeira candidatura a prefeito de Vitória da Conquista, o radialista Hérzem Gusmão fez dos microfones da Clube FM a sua artilharia e lançou, diariamente, rajadas de pedras aos céus, em sua obstinada – para não dizer obsessiva – busca pelo poder.
A voz oficial da administração da cidade, ecoada pelos canais institucionais de comunicação da Prefeitura e amplificada pela voz potente do prefeito e sua notória capacidade de comunicação, não devem ser a palavra final sobre assuntos de interesse público.
Houve uma legítima pedalada, ao tentar jogar para o exercício que se inicia, despesa do exercício anterior. Ou não?
Porque o adicional de ⅓ das férias do professorado municipal, sem comunicação prévia, não fora creditado em dezembro, como acontecia há 20 anos? O limite permitido de gastos com pessoal foi ultrapassado ou não?
Ao se justificar pela sua comunicação oficial, Hérzem reduz uma afronta direta à Lei de Responsabilidade Fiscal a uma mera questiúncula burocrática. Tão insignificante, que nem precisa ser explicada. “Entraves burocráticos” diz a nota. Entraves burocráticos, oras! Nada demais…
Como se pudesse funcionar como álibe, o texto atribui a prática ao Governo do Estado, onde a regra é a mesma que prevaleceu no funcionalismo municipal nos 20 anos anteriores à posse do atual prefeito. Neste caso, a verdade factual é uma mentira oficial, porque essa prática não acontece como regra na rede estadual pelo menos desde 2007 – se isso algum dia foi regra em qualquer governo.
Coisa parecida se fez para justificar o recuo atabalhoado numa decisão relevante e com potencial para azedar a relação com vereadores. A publicação de um decreto com o veto total a um projeto aprovado na Câmara por unanimidade foi atribuído a um “problema técnico na atualização do Diário Oficial”. A regulamentação dos paredões de som foi apresentada pela sua base e encaminhada para o prefeito sancionar, vetar em parte ou no todo e publicar sua decisão do DOM. Depois de mais uma sequência de justificativas, entre Câmara e Prefeitura, já não se sabe se o projeto afinal foi ou não votado e aprovado. Mas foi encaminhado pela Secretaria da Câmara como se fosse.
Falando em “defesa do interesse público” e em “inconstitucionalidade” para justificar o veto total, o texto de um decreto impresso em papel timbrado com o brasão do Município foi parar na mesa do prefeito. Se o gestor da capital do Sudoeste assina um documento dessa importância sem ler atentamente antes a cidade está sob risco.
Através de um login e uma senha, o sistema on line de edição do Diário Oficial do Município identifica o usuário e registra data e hora de cada operação de envio de conteúdo para publicação. A versão oficial de “problema técnico na atualização” não sobrevive a meia dúzia de cliques pelo servidor responsável pela administração do sistema. A verdade factual é mais uma vez torturada, e vira mais uma mentira oficial.
O dever de responsabilidade para com a sociedade no trato da palavra é o único limite aceitável a um comunicador. Mas para qualquer pessoa distinguida com um mandato popular, este dever de zelar pelo que se diz é um imperativo ético. Um comunicador não deve banalizar o valor da palavra, matéria-prima do seu ofício. Um prefeito não tem o direito de fazê-lo.
Como na Física, a Lei da Gravidade, que explicou cientificamente a queda de uma maçã sobre a cabeça de Isaac Newton, tem sua equivalente na política. Ela atrai as pedras atiradas para cima para a cabeça de quem joga. Várias, inevitavelmente cairão em alta velocidade sobre o cucurute do atirador.
Para merecer o reconhecimento público e os aplausos por acertos de uma gestão, é preciso ter humildade e disposição para reconhecer erros que qualquer pessoa é capaz de cometer. Transferir para a seringa da reprovação pública o braço de servidores, não é só falta de coragem. É falta de honestidade intelectual, para dizer o mínimo.

*Ernesto Marques é jornalista formado pela Facom-UFBa e é o atual vice-presidente da Associação Baiana de Imprensa – ABI

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