Cotidiano

Médicos alertam para riscos de acidentes com fogos de artifício no mês de junho

Com o início da tradicional temporada de festas juninas, especialistas recomendam redobrar os cuidados para evitar acidentes com fogos de artifícios. O alerta se deve ao fato de que o mês de junho costuma engrossar o número de internações e mortes relacionadas à queima de fogos utilizados nas brincadeiras.

Segundo levantamento do Conselho Federal de Medicina (CFM), baseado em informações do Ministério da Saúde, de 2008 a 2016 ocorreram 4.577 internações de pacientes que se queimaram com artefatos explosivos. A média no país é 85 atendimentos só nos meses de junho, o que corresponde a um terço do total de ocorrências anuais.

O estado da Bahia lidera o número de acidentes, seguido de São Paulo e Minas Gerais. “Nós interpretamos que seja em função da nossa cultura, da nossa tradição. Aqui na Bahia, e no nordeste todo, a grande festa do calendário anual de festas é o São João. Mas, o grande drama é que essa tradição cultural tem nos fogos de artifícios uma das mais tradicionais expressões. É aí que surge o problema, porque as pessoas se queimam, centenas precisam ser internadas e muitas delas ficam mutiladas pelo resto da vida”, explica Jecé Brandão, vice-presidente do CFM, e conselheiro da entidade pelo estado da Bahia.

A probabilidade de ocorrência desse tipo de acidente cresce também no período de festas de fim de ano e em manifestações populares, como o que ocorreu recentemente durante os protestos em Brasília, no qual um rapaz perdeu alguns dedos da mão.

“Esses fogos em vez de explodirem no ar eles explodem dentro do morteiro, aí causam lesões catastróficas. São lesões mutilantes com perdas de dedos, perda de função e isso vai levar também à perda da qualidade de vida do paciente. Existem lesões menores, queimaduras que nem precisam de cirurgias reparadoras, não deixam tanta sequela, mas exigem tratamento prolongado, sacrifício do paciente, da família e também o custo social para o próprio país”, explica o cirurgião Carlos Henrique Fernandes, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia da Mão.

Os médicos explicam que os fogos e explosivos além de provocar queimaduras e mutilações podem deixar outras sequelas graves e irreversíveis. “Nós estamos falando de 4.500 pessoas que foram gravemente queimadas, porque a grande maioria não fica internada. Muitas delas ficaram com sequelas de perda de dedo, perda da mão, às vezes, esses fogos atingem a retina e provocam uma cegueira. Ou às vezes, o explosivo é tão intenso que rompe o tímpano e o indivíduo fica surdo pelo resto da vida”, explica Jecé.

Os acidentes podem ainda levar à morte. Nos últimos dez anos ocorreram mais de 100 óbitos causados por queimaduras graves de fogos de artifício. Só em 2015, último ano que se tem registro de mortalidade por esta causa, foram 18 mortes, segundo o levantamento do CFM. A maioria das vítimas são homens e jovens.

“A mortalidade é diretamente proporcional à qualidade do atendimento que essas pessoas precisam receber. São pacientes extremamente difíceis de serem tratados, porque a pele é o grande anteparo entre o meio interno do ser humano e o mundo de micróbios e bactérias que estão na atmosfera e no ambiente natural. Então, quando a gente perde a integridade da pele o indivíduo fica vulnerável à infecção, que é o grande fator que leva à morte”, explica o médico.

Prevenção

O alerta dos médicos é dado nas vésperas do Dia Nacional de Luta Contra Queimaduras , celebrado em 6 de junho. O objetivo é motivar os municípios a restringirem o uso dos fogos nas manifestações culturais e aumentarem o controle sobre a entrada desse tipo de artefato nos eventos.

O médico cita o exemplo do município Cruz das Almas, que proibiu a prática conhecida como “guerra de espadas”. A brincadeira em que pessoas lutam com chamas de fogo é considerada crime desde 2011 na cidade. “Se a gente constata que uma coisa está matando objetivamente pessoas que, na grande maioria, estão entre 20 e 40 anos, são adultos jovens que vão brincar e perdem suas vidas, então está na hora de fazer um grande debate sobre isso e democraticamente abolir esses elementos perigosos da festa”.

O cirurgião Carlos Henrique cita também como exemplo a proibição de fogos de artifício em eventos esportivos. “Uma coisa que no passado nós tínhamos, mas conseguimos eliminar, eram acidentes com fogos nos eventos esportivos, principalmente nos jogos de futebol. Hoje, com o controle da polícia impedindo o acesso de fogos aos estádios, esses números diminuíram bastante”, relata Carlos.

A Sociedade Brasileira de Cirurgia da Mão chama atenção ainda para o risco do manuseio clandestino dos fogos. “Existem diversos tipos de fogos de artifícios, desde os mais até os menos potentes. Mas, mesmo os menos potentes são suficientes para causar queimaduras, machucar a mão das pessoas. Então, as orientações principalmente são de que as pessoas utilizem os fogos de artifício de acordo com as recomendações dos fabricantes. Muitas vezes, pra aumentar o poder dos fogos, as pessoas começam a misturar pólvora, a manusear isso irregularmente”, disse.

Além da campanha de prevenção, a entidade médica quer aproveitar o período de festas juninas para fazer uma pesquisa sobre os principais acidentes que atingem as mãos. “Só com a continuidade das campanhas, com a educação, principalmente das crianças para que elas evitem brincar com fogos de artifício é que a gente vai conseguir ter uma diminuição dessa prevalência”, disse Carlos.

Em caso de acidentes, os especialistas orientam ainda que a vítima não deve se automedicar e deve ser encaminhada imediatamente a um centro especializado. “Há uma orientação de não colocar nada [no local queimado], porque as pessoas tem a tradição de colocar manteiga, pasta de dente, a pomadinha que tem em casa. A orientação é não fazer absolutamente nada. No máximo, pode lavar um pouco com água limpa, mas não deve cobrir. O ideal é levar para serviço médico, porque a região onde acontece a queimadura fica exposta a infecções, de forma que quanto menos manipular a região queimada antes de levar ao serviço médico é melhor”, recomenda Jecé.

*EBC

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